sábado, 29 de outubro de 2016

Planejamento tributário internacional: a prática do “treaty shopping” e a elisão fiscal.

A expressão “treaty shopping” nasceu nos Estados Unidos a partir do termo “fórum shopping”, instituto utilizado no processo civil americano. Através deste instituto, o litigante tentava eleger a melhor jurisdição, para que esta lhe desse a melhor prestação jurisdicional, ou seja, um resultado mais favorável ao seu pleito.
   
Neste mesmo viés, percebemos que nas atuais operações de “treaty shopping” o contribuinte visa se favorecer de um acordo de bitributação do qual o seu país de origem não seja beneficiário, buscando o melhor país para estabelecer as chamadas “empresas-canais” e usufruir dos melhores acordos tributários.
   
Vejamos como isso acontece.
 
A bitributação ocorre quando o mesmo fato gerador é tributado duas vezes por entes diferentes.
   
Os acordos de bitributação são meios de evitar tal prejuízo fiscal, estabelecendo regras para repartir, entre os países, a receita da tributação de renda de cinco operações: lucros, royalties, juros, serviços e dividendos. Assim, visam dar isonomia ao investidor no exterior em relação aos concorrentes estrangeiros, evitar a dupla tributação e as elisões fiscais (sonegação), aumentar a segurança jurídica para os investidores, e estimular os investimentos estrangeiros no país.
     
Mas o que acontece quando uma empresa busca realizar uma operação comercial e o seu país sede não possui acordo de bitributação com o país de destino? Bom, a alternativa que vem sendo utilizada para evitar pagar carga majorada do tributo é a prática do treaty shopping.
     
Vamos imaginar uma pessoa física residente no Brasil e que detém investimentos em uma sociedade americana.
           
Partindo-se do pressuposto que Brasil e Estados Unidos não têm entre si um tratado de dupla tributação, esta pessoa constitui uma 
holding (filial subsidiária) na Hungria com o propósito único de se beneficiar do tratado estabelecido entre Estados Unidos e Hungria, que prevê uma redução de alíquota de retenção na fonte sobre os dividendos:



Desta forma, os rendimentos sofrem uma carga tributária mais leve, conseguindo fazer uso dos benefícios do acordo de bitributação.
 
Uma das principais problemáticas que envolvem o treaty shopping é a questão da aferição de sua ilegalidade, pois existem debates em que sua legalidade pode ser sustentada com base na autonomia da vontade, a não obrigatoriedade de selecionar o caminho com maior carga fiscal ou mesmo pelos deveres do administrador da sociedade de empregar recurso de forma a atingir os objetivos estatutários da empresa.
           
A sua ilegalidade, de outro lado, encontra respaldo na figura da fraude à lei ou mesmo pelo reconhecimento do abuso de direito, por ser inaceitável a seleção pessoal da competência tributária. Apesar do aparente benefício comercial, esta prática é vista pelos Estados como meio de elisão fiscal, e cada vez mais crescem as medidas para evitar o aparecimento das empresas “de fachada” nos territórios dos países.
         
Também tem sido levantado que o treaty shopping infringe a reciprocidade de um tratado e altera a balança de concessões aí atingidas entre os dois Estados contratantes. Quando o residente de um terceiro país usufrui de determinado tratado, as concessões do convênio são estendidas ao Estado não participante desse acordo, que não tem para com os contratantes deveres e direitos recíprocos.

Por depender de decisão política, é, atualmente, grande desafio indicar o tratamento mais adequado a ser adotado em relação ao
treaty shopping. No Brasil, já se observa que em alguns tratados celebrados foram incluídas cláusulas limitativas de tais benefícios. 

A título de singelo palpite, a melhor saída seria a que se ponderasse até que ponto a utilização do treaty shopping irá trazer benefícios para a economia, dinamizando o mercado global, sem causar impacto relevante às receitas tributárias.


Referências

BECKER, Helmut e Wurm, Felix J. Treaty Shopping – An Emerging Tax Issue and its Presents Status in Various Countries, 1988. In: SCHOUERI, Luís Eduardo. Planejamento Fiscal Através de Acordos de Bitributação: Treaty Shopping. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995.

GRUPENMACHER, Betina Treiger. Tratados Internacionais em Matéria Tributária e Ordem Interna.1. ed. São Paulo: Dialética, 1999.
TÔRRES, Heleno Taveira. Direito Tributário Internacional: Planejamento Tributário e Operações Transacionais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais
Tratados Internacionais em Matéria Tributária. Revista da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Curitiba, v.5.
SCHOUERI, Luis Eduardo. Planejamento fiscal através de acordos de bitributação: treaty shopping. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1995.
FERNANDES, Rayneider Brunello Oliveira; BONITO, Rafhael Frattari. Treaty shopping: Planejamento tributário no plano internacional ou forma de abuso de direito. Revista da Faculdade de Direito da UERJ, Rio de Janeiro, v. 1, n. 23, 2013.

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Direito tributário descomplicado: espécies tributárias

É muito comum se deparar com notícias e discussões sobre tributos, mas na prática poucos cidadãos conhecem as espécies tributárias e sabem o que estão pagando.
Peço licença para usar o velho clichê dos tributaristas, mas só existem duas certezas na vida: a morte e o pagamento de tributos. Assim como enuncia Fernando Scaff: “Nascer é uma possibilidade. Nascidos, é certo que morreremos. E seremos tributados, do nascer ao morrer” [1]. É a arrecadação que sustenta o Estado e a vida em sociedade, e por isso a importância do seu estudo.
Antes de iniciar qualquer análise ou discussão sobre a matriz tributária brasileira, é importante entender como ela funciona. No primeiro texto foram abordadas as funções e a importância do tributo na sociedade contemporânea, para explicar o porquê dessa cobrança. Hoje irei apresentar as espécies tributárias que o constituinte brasileiro criou para custear as despesas estatais.
Inicialmente, importante esclarecer a definição de tributo, que se encontra no artigo 3º do Código Tributário Nacional, o qual dispõe:

Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

O tributo, portanto, é gênero, dividindo-se em cinco espécies tributárias [2]: os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria, os empréstimos compulsórios e as contribuições especiais.
Os impostos, muitas vezes utilizado erroneamente para tratar de outras espécies tributárias, é o principal meio de arrecadação do Estado, utilizado para suprir necessidades públicas diversas. Supre a maioria dos gastos comuns e ordinários, como a folha de pagamento de servidores até despesas de um prédio onde funciona um órgão público.
Diferente das outras espécies tributárias, os impostos tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica em relação ao contribuinte [3], sendo decretado exclusivamente em função do poder de império do Estado, isto é, não são vinculados a uma contraprestação estatal e não possuem uma destinação específica. Dessa forma, o valor arrecadado com IPTU, por exemplo, não será necessariamente gasto com obras relacionadas à imóveis, ou o valor arrecadado com IPVA não será obrigatoriamente utilizado para melhorias e manutenção das estradas e vias públicas. Ademais, a Constituição Federal estabelece que é proibida a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa [4].
As taxas, por sua vez, são tributos vinculados a uma contraprestação estatal direta. Possuem como fato gerador o exercício regular do poder de polícia da administração, englobando fiscalizações e licenciamentos em geral, ou a utilização, efetiva ou potencial, de um serviço público específico e divisível, prestado ao cidadão ou posto à sua disposição. Conforme bem explica Luciano Amaro [5], o Estado exerce determinada atividade e, por isso, cobra a taxa da pessoa a quem aproveita aquela atividade. A taxa de polícia, por exemplo, é cobrada em razão da atividade do Estado, que verifica o cumprimento das exigências legais pertinentes e concede a licença, a autorização ou o alvará [6].
Já a contribuição de melhoria constitui na exigência imposta aos proprietários de bens imóveis valorizados com a realização de determinada obra pública. Tem fundamento ético-jurídico no princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, visto que possui o intuito de indenizar o erário pela vantagem econômica gerada, ainda que o contribuinte não a tenha solicitado. Ressalta-se que o referido tributo pressupõe obrigatoriamente uma obra pública e depende da valorização do bem imóvel. Possui previsão no artigo 145, inciso III, da Constituição Federal, e nos artigos 81 e 82, do Código Tributário Nacional.
Os empréstimos compulsórios, previstos no artigo 148 da Constituição Federal, como o próprio nome denuncia, são arrecadações forçadas, porém restituíveis. São tributos vinculados, devendo ser destinados ao atendimento das despesas que fundamentaram a instituição do empréstimo, quais sejam: para atender despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência, ou para investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional. A obrigação de pagá-los surge de uma determinação legal. Verificada a ocorrência do fato gerador, surge a obrigação de emprestar dinheiro ao Estado. 
As contribuições especiais, por fim, são tributos destinados ao financiamento de gastos específicos, relacionados à intervenção do Estado no campo social e econômico, como instrumento de ação nas respectivas áreas. A Constituição Federal, em seu artigo 149, estabelece três espécies de contribuições especiais: as contribuições sociais, as contribuições de intervenção no domínio econômico e as contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas. Sua principal característica é a parafiscalidade, isto é, as atividades de arrecadação e fiscalização do referido tributo são realizadas por um ente parafiscal em razão de atividades especiais por elas desempenhadas, como é o caso das autarquias como o Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA), o Conselho Regional de Contabilidade (CRC) e o Conselho Regional de Medicina (CRM).
Agora você, contribuinte, tem uma noção da diferença dos vários tributos pagos diariamente. Já conhecia a diferença entre as espécies tributárias? Gostou da explicação? Acha que pagamos muitos tributos? Deixe seu comentário e sua dúvida, que nos próximos artigos iremos discutir alguns dos problemas da matriz tributária brasileira.





[1] SCAFF, Fernando Facury. Duas coisas são certas na vida: a morte e os tributos. In Revista eletrônica Consultor Jurídico, nov. 2012. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-nov-06/contas-vista-duas-coisas-sao-certas-vida-morte-tributos> Acesso em 25/10/2016
[2] Há discussão na doutrina a respeito da quantidade de espécies de tributárias existentes. Optou-se por utilizar a teoria pentapartida, adotada pela doutrina majoritária. Cf Sabbag, Eduardo. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
[3] Artigo 16, do Código Tributário Nacional
[4] Artigo, 167, inciso IV, da Constituição Federal de 1988
[5] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 14. ed., p. 31.
[6] Ibidem, p. 33

domingo, 23 de outubro de 2016

Compliance Concorrencial

Recentemente, tivemos aqui no Núcleo uma clara definição referente ao Compliance Anticorrupção e, ainda, uma breve introdução aos Programas de Compliance, que estes têm como premissa principal inserir postura e cultura ética, moral e transparente em todos os negócios corporativos, de modo que não seja possível dissociar seu comportamento com a observância das leis e de suas normas internas, ou seja, fazer com que o cumprimento correto das leis, normas e regulamentos estejam presentes antes mesmo da execução de qualquer atividade e, que isto se torne algo natural, sem barrar, por exemplo, o cumprimento de metas, pois tais práticas estarão incorporadas ao negócio como sendo fundamental.

E o compliance concorrencial?

No Brasil, a regulamentação principal no combate às condutas fraudulentas nos atos concorrenciais é bem recente, deu-se com a publicação da Lei federal 12.529/2011 (Lei de Defesa da Concorrência – LDC), onde prevê a estruturação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE); todo o aparato administrativo-judicial visando a defesa da ordem econômica; o que constitui infração nos atos concorrenciais; e, ainda, a punição e o compromisso de cessação a tais atos.

compliance concorrencial não trata de concorrência desleal, mas sim de ato anticoncorrencial. A concorrência desleal continua a cargo da justiça cível, onde ocorre quando, por exemplo, uma empresa denigre de alguma forma a imagem da outra; utiliza indevidamente sua marca; ou faça menção desonrosa a alheia. O que se trata aqui são atos anticoncorrenciais, quando, por exemplo, ocorre formação de cartéis, de consórcios a fim de destituir outros concorrentes em licitações etc.

As infrações anticoncorrenciais podem ocorrer quando uma determinada empresa (ou em conjunto com outras) pratique certo ato que atente contra a ordem econômica e a coletividade, sendo algumas violações: aos ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, à livre concorrência, à função social da propriedade, aos direitos dos consumidores, ao poder econômico, dentre outros.

Um programa de compliance concorrencial busca, em primeiro lugar, prevenir e reduzir o risco de ocorrência de violações específicas à LDC* e, em segundo lugar, oferecer mecanismos para que a organização possa, rapidamente, detectar e lidar com eventuais práticas anticoncorrenciais que não tenham sido evitadas em um primeiro momento1.

Quando verificada a prática de tal ato infracional, a empresa poderá preventivamente informá-lo ao CADE, celebrando um acordo de leniência, tendo por isto um “bônus” de extinção ou redução das penalidades cíveis e criminais aplicáveis à pessoa física e jurídica. No acordo de leniência o objetivo é obter informações e documentos que comprovem infrações contra a ordem econômica, bem como identificar os demais participantes na conduta2. O acordo pode ser celebrado nos casos em que, na ocasião da sua propositura, o CADE ainda não disponha de provas suficientes para assegurar a condenação dos envolvidos. Entretanto, por ainda não termos difundida essa cultura preventiva, os comunicados aos órgão competentes tem ocorrido de forma reativa/coercitiva.


Por fim, no compliance concorrencial não há que se falar apenas quanto ao cumprimento das legislações reguladoras dos atos concorrenciais, mas sim, concomitante as demais normas regentes à empresa e ao ramo que se atua.







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* Lei de Defesa da Concorrência n. 12.529/2011
1. Guia Compliance. Disponibilizado no site do CADE, acessado em 22 out 2016, disponível em <http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes-institucionais/guias_do_Cade/guia-compliance-versao-oficial.pdf>.
2. Programa de Leniência. Disponibilizado no site do CADE, acessado em 22 out 2016, disponível em <http://www.cade.gov.br/assuntos/programa-de-leniencia>
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REFERÊNCIA
GONSALES, Alessandra. Compliance: A nova regra do jogo. São Paulo: LEC, 2016.

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Prática Colaborativa: alternativa às decisões judiciais ineficazes


A Justiça Brasileira é ineficaz, apesar dos esforços dos personagens envolvidos. É preciso dizer mais? Em 2014, segundo o último Relatório Justiça em Números[1] (2015), tramitaram 28,9 milhões de processos novos, tendo sido julgados 26,9 milhões – mantida a média histórica de 3,4% a mais de processos anualmente. Infere-se, assim, que a solução para os litígios não passa pelo judiciário, fazendo-se necessário meios alternativos de solução de conflitos, como a Prática Colaborativa.

A Prática Colaborativa – diferente de um processo judicial litigioso – consiste diretamente na construção de um resultado pelas partes envolvidas, promovendo-se entre si a construção de um acordo sustentável no tempo. Por isso essa metodologia – em que não há novidade em seu conceito, pois que existem outras metodologias alternativas de resolução de conflito, mas, sim, em sua implementação – ganha espaço em áreas do Direito, como no Direito Civil, no Direito Empresarial e, especialmente, no Direito de Família.

Os conflitos pertinentes ao Direito de Família – notoriamente a dissolução do vínculo conjugal - usualmente perpassam os envolvidos, alcançando-se não raro os filhos e demais parentes; daí a importância de, com cooperação e respeito, ter o auxílio de advogados, psicólogos e consultores financeiros para diminuir o impacto de tão difícil decisão na vida conjugal. Justamente a abordagem multidisciplinar, não litigante e extrajudicial que expande as possibilidades de comutar a decisão singular de um juiz pelo acordo entre as partes.

Ainda que existam conflitos entre os cônjuges, para que haja a aplicação deste método é fundamental que as partes despojem-se de mágoa, raiva e desejos de vingança – objetivo principal da metodologia. Ainda que a priori pareça insensato solicitar prudência em uma situação intricada, a aplicação da Prática Colaborativa expande-se com mais vigor justamente nesse ramo do Direito.

No vídeo abaixo, o Instituto Innovare, que promove a adoção de Práticas Colaborativas, explica o que é e como funciona o método, além de mostrar o testemunha de pessoas impactadas pelas técnicas aplicadas aos envolvidos.


Segundo a advogada americana especializada em Práticas Colaborativas, Sherrie R. Abney[2], o processo começa com a assinatura do acordo, em que é explicada a metodologia e marcados os encontros, nos quais serão identificados os problemas, os interesses e as zonas de convergência entre os cônjuges – concomitantemente atuando-se os profissionais envolvidos.

A presença do profissional do direito não cinge-se em aplicar  o Direito para o seu cliente, mas sim em ajudá-lo a compor um acordo que ainda terá de ser homologado por um juiz.

Por fim cabe expor uma metodologia largamente difundida na psicologia e que começou a ser utilizada como instrumento da Prática Colaborativa: a Conciliação Sistêmica [3]. Esse método é bastante utilizado no Direito de Família, consistindo em um profissional habilitado que insere os cônjuges nas situações que os levaram ao conflito para que possam refletir e observar por uma nova ótica.





[1] http://s.conjur.com.br/dl/relatorio-justica-numeros-2015-final-web.pdf
[2] http://www.collaborativelaw.us/articles/new_way_of_doing_business.pdf
[3] Desenvolvido por Bert Hellinger


quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Compliance Anticorrupção – Descomplicado

Corrupção, tema que tem sido capa de revistas e destaque em jornais do Brasil e do Mundo!

·    O que é Corrupção?
A palavra corrupção vem do latim corrupta. É a junção das palavras cor (coração) e rupta (quebra, rompimento) e significa ato ou resultado de corromper; degradação de valores morais ou dos costumes; ato ou efeito de subornar alguém para vantagens pessoais ou de terceiros.





   
O Crime de Corrupção trata-se de ato contra a Administração Pública, está previsto nos artigos 317 e 333 do Código Penal Brasileiro e é classificado em Corrupção Passiva e  Corrupção Ativa.
O Crime de Corrupção Passiva consiste na solicitação ou recebimento, em razão de função pública, de vantagem indevida, ou seja, solicitação ou recebimento de pagamento ou promessa de pagamento indevido. O crime é cometido por funcionário público no exercício de sua função.
O Crime de Corrupção Ativa, por sua vez, consiste em oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, em troca de favor ou benefício. O crime é cometido por particular.
Importante observar que, para a configuração do crime de Corrupção, necessariamente deve haver um funcionário público envolvido.


·    E qual o grande mal da Corrupção?

Essa prática afeta diretamente a sociedade, contribui para a instabilidade política e inibe o crescimento social e econômico, diminuindo os investimentos na saúde, na educação, na segurança e no transporte público.



·    A Corrupção ocorre apenas no Brasil?
Enganado está quem pensa que a Corrupção é um problema único e exclusivo do Brasil.
A Corrupção é um fenômeno presente em todos os países do mundo, presente tanto em países em desenvolvimento, como em países já desenvolvidos.


             
É por essa razão que diversos países têm trabalhado na elaboração e rigorosa aplicação de legislações e medidas anticorrupção, por exemplo: Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), dispositivo Americano anticorrupção; UK Bribery Act, dispositivo anticorrupção do Reino Unido; Lei Brasileira nº 12.846/2013, famosa lei anticorrupção; além de Convenções internacionais, com destaque para a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção, que prevê a implementação de políticas efetivas contra a corrupção e tem como objetivo prevenir e combater a corrupção em todas as formas.
Foi após a criação do FCPA que os Estados Unidos pressionaram os demais países a adotarem legislações similares e influenciaram o Brasil na criação da Lei nº 12.846/2013, Lei de Anticorrupção.
A Lei Anticorrupção Brasileira estabelece responsabilidade objetiva, civil e administrativa, de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira, não importando se a empresa tinha ou não conhecimento do ato de corrupção.
A Lei 12.846 traz, ainda, incentivos e tratamentos diferenciados para empresas que possuam Programas de Compliance.


·    Programa de Compliance? 



São medidas adotadas por empresas para garantir o cumprimento de legislações e regulamentações relacionadas às suas atividades, observando princípios de ética e integridade.
Mais especificamente, Programas de Compliance Anticorrupção são mecanismos voltados à prevenção e detecção de atos de corrupção, bem como voltados  à remediação,  quando identificado algum desvio de conduta, mitigando a penalização da pessoa jurídica.
Nesse panorama,  onde se observa uma crescente pressão da sociedade para o combate à corrupção e, consequentemente, uma rigorosa aplicação de sanções pela prática de corrupção, é de extrema importância a implementação de Programas de Compliance.
Embora a existência de um Programa de Compliance não seja obrigatória, diversas empresas têm implementado a cultura anticorrupção por ser um fator redutor de eventual sanção e, muitas vezes, indispensável, como, por exemplo, para contratos de Fusão e Aquisição e contratos com governos ou empresas estrangeiras.

“Empresas que comprovadamente agem de forma diligente na prevenção de violações devem ser diferenciadas daquelas que agem de má-fé ou que adotem uma conduta negligente diante dos riscos de que condutas indevidas sejam cometidas por seus empregados ou agentes na obtenção de negócios ou outras vantagens comerciais.”[1]

Ainda, notícias envolvendo práticas de corrupção  geram sérios danos à imagem e reputação das empresas.
Por essas e outras razões que muitas empresas, apesar da não obrigatoriedade, incrementam  Programas de Compliance e, muitas vezes, investem valores superiores ao de eventual sanção.
No Brasil, foi criado o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União (CGU), que tem como função realizar atividades relacionadas ao incremento da transparência da gestão e à defesa do patrimônio público, através de ações de controle interno, auditoria pública, correição, prevenção e combate à corrupção.
A CGU, autêntica agência anticorrupção, junto com o Ministério Público Federal, Polícia Federal, Tribunal de Contas da União e Advocacia Geral da União, trabalha na prevenção e combate à corrupção.
O combate à corrupção depende da atuação conjunta de todos os órgãos de Defesa do Estado, depende da iniciativa privada, com implementação de  programas de Compliance, e, também, de uma mudança cultural e social profunda, começando por você!

 #CORRUPÇÃONÃO









Referências
CGU, disponível em: <http://www.cgu.gov.br/sobre/institucional>. Acesso em: 17 de outubro de 2016.
Convenção das Nações Unidas, disponível em :<http://www.unodc.org/lpo-brazil/pt/corrupcao/convencao.html> . Acesso em: 17 de outubro de 2016.
Dicionário Michaelis. Disponível em:   <http://michaelis.uol.com.br/busca?r=0&f=0&t=0&palavra=Corrupção>. Acesso em: 18 de outubro de 2016, às 19:11
MAEDA, Bruno Carneiro. Programas de Compliance e Anticorrupção: importância e elementos essenciais.
UNODC e Corrupção. Disponível em: <http://www.unodc.org/lpo-brazil/pt/corrupcao/>. Acesso em: 18 de outubro, às 20:30





[1] MAEDA, Bruno Carneiro. Programas de Compliance e Anticorrupção: importância e elementos essenciais. P.171

domingo, 16 de outubro de 2016

O aumento do cárcere e o aprisionamento dos direitos


Somos o quarto país no mundo que mais prende. Aparentemente esta posição no ranking pode não significar muito para a população, ou ao senso comum, que acredita cegamente na frase: “a polícia prende e o judiciário solta”. Para esses, a recente decisão do STF foi uma vitória, em que fere claramente o princípio constitucional da presunção da inocência ao decidir que a prisão pode ser decretada antes do trânsito em julgado da condenação.
Vivemos um retrocesso na área dos direitos constitucionais.
Nossas cadeias, centros de detenção provisória e presídios já estão abarrotados de pessoas aguardando julgamento, segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), entre 10 pessoas presas, 4 aguardam condenação, ou seja, 41% da população carcerária aguarda condenação. Se antes, a presunção de inocência era um direito a ser alcançado, garantido e preservado, agora, com esta decisão da Suprema Corte seremos vitoriosos, e com capacidade para atingir o topo do ranking dos países que mais prendem.
Isso não seria problema algum, se a prisão realmente fosse a solução contra a violência e o aumento da criminalidade, mas a história (e os números) nos mostram que este não é o caminho. Em 1990 foi promulgada a Lei n. 8072, mais conhecida como a Lei de Crimes Hediondos, aumentou a pena para crimes mais graves e que provocam repulsa social, como homicídio, latrocínio, estupro, genocídio, tortura, tráfico de drogas, entre outros.
Pesquisa realizada pelo Instituto Latino Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente (Ilanud) comprovou o efeito inócuo aos crimes de homicídio e tráfico de drogas.
Nota-se que desde 1984 as taxas de encarceramento no estado de São_Paulo apresentam crescimento, porém, destaca-se o período a partir de 1997 em que as taxas elevaram-se acima do dobro.
Em uma análise mais detalhada dos crimes cometidos no estado de São Paulo, neste período, a pesquisa apurou que os crimes considerados hediondos não diminuíram, pelo contrário, alguns como latrocínio teve aumento de 7% entre 1981 e 1996, e o tráfico de drogas passou de 5,6% em 1982 a 9% em 1990.
De modo visível, o crescimento da taxa de encarceramento está acompanhado de certo incremento no percentual dos condenados por crimes hediondos, no entanto, não se pode apontar a Lei de Crimes Hediondos como único fator para superpopulação prisional do referido estado, mas podemos associá-la a outros mecanismos como o endurecimento no regime de cumprimento das penas.
No contexto atual, diante de tantos traços de violência, seja intramuros ou fora dos presídios, contribuir para o aumento da taxa de encarceramento é corroborar para a exclusão e desigualdade social, sem nada fazer em prol de política carcerária e ações efetivas no combate da criminalidade.
O princípio da inocência, é uma cláusula pétrea, assim como o princípio do contraditório. Defender a celeridade jurídica a qualquer preço, e colocando-a frente aos direitos constitucionais valiosos causará prejuízos sociais irreversíveis. Cada vez mais vemos nossas prisões se encher, enquanto o poder público busca saída para privatizar os presídios, um modo de tirar o problema de suas mãos. Mas e as pessoas? Como fica a vida de indivíduos que infringiram as normas sociais? A reintegração social, neste momento, mais uma vez, fica em segundo plano e o pior, de onde deveria vir nosso último fôlego de esperança, surgem cada vez mais atrocidades contra os direitos.

Referências
BRASIL.
Lei de Crimes Hediondos: Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8072.htm>
RELATÓRIO ILANUD. A Lei dos Crimes Hediondos como instrumento de política criminal. Ministério Público Federal – Procuradoria da República em São Paulo. jul. 2005. Disponível em: file:///C:/Users/10605608/Downloads/Relatorio%20ILANUD%20-%20A%20Lei%20dos%20Crimes%20Hediondos%20como%20instrumen.pdf.