sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Financiamento Privado de Campanha e Lobby. Por que Legalizar?

Com a pequena reforma eleitoral de 2015, as doações empresariais à candidatos foram proibidas. Restou  acordado que pessoas jurídicas poderiam doar apenas a partidos políticos. Todavia o Supremo Tribunal Federal expressou entendimento ainda mais restrito, vedando qualquer tipo de doação empresarial à campanhas na Ação Direta de Inconstitucionalidade n*4650. Nenhum valor doado por empresas pode compor recursos utilizados em campanhas. Pontuamos acerca da manifestação não unânime apresentada pelo Supremo que o financiamento privado de campanha, evidentemente continuará a existir, e agora sem transparência e accountability. 
A ministra Rosa Weber, posicionou-se contra o financiamento privado de campanhas eleitorais argumentando sua inconstitucionalidade. Argumentou que a influência do poder econômico compromete a "normalidade e a legitimidade das eleições". Segundo a magistrada: "A influência do poder econômico culmina por transformar o processo eleitoral em jogo político de cartas marcadas, odiosa pantomima que faz do eleitor um fantoche, esboroando a um só tempo a cidadania, a democracia e a soberania popular".
Já o ministro Celso de Mello, tomou posição mais realista e ponderada, a qual julgamos ser correta, expondo o seguinte: “Entendo que não contraria a Constituição o reconhecimento da possibilidade de pessoas jurídicas de direito privado contribuírem mediante doações para partidos políticos e candidatos, desde que sob sistema de efetivo controle o qual impeça o abuso do poder econômico."
De fato, o rastreamento dos recursos investidos será mais dificultoso devido o entrave existente. Tanto a atividade de lobby  enquanto defesa de interesses legítima e reflexo orgânico da evolução das instituições democráticas e o financiamento privado de campanha continuarão a ter espaço no jogo político. Sopesando-se a ignorância em relação às atividades, sua negação ou até mesmo criminalização.
Além de negar-se a possibilidade lícita de contribuição de grupos de pressão quais sejam associações sindicais, coletivos, setores sociais, corporativos ou/e empresariais em detrimento do presumido ‘interesse público’. A vedação ao financiamento privado ignora ainda o interesse de pessoas físicas exercentes de atividade empresarial, as quais organizam-se em grupos e coletivos a fim de terem suas demandas concretizadas em projetos de leis ou direcionamentos de políticas públicas. Em contrapartida o sistema eleitoral periódico necessita de patrocínio, e antes a contribuição de associações, corporações e grupos de pressão do que o Estado já viabilizador de campanhas através do fundo partidário, e doador de maneira ilegal, como se observa com os desvios de recursos de empresas públicas, conforme apurado nas Operações Zelotes e Lavajato. 
Ressaltam-se ainda como pontos negativos sobre a proibição do financiamento privado de campanha a) a dificuldade de estabelecer um teto para as doações que possa reduzir os custos e que, ao mesmo tempo, seja aceitável para todos os partidos, sem empurrar a maior parte das campanhas para a ilegalidade. E b) o fato de que a proibição da doação empresarial é artificial, já que as eleições continuariam muito competitivas. Pode ser arriscado confiar que todos os candidatos e empresas cumpram a lei e não façam transações entre si. Lembrando que as doações de empresas já foram proibidas no Brasil até 1993, mas na prática essas transações aconteciam do mesmo jeito, tornando tal proibição letra morta; E Ainda o teto de 700 reais para doações de cidadãos é evidententemente baixo. 
Posto isso, compreendemos que o financiamento de campanha privado legalizado e com limites estipulados, tal como a regulamentação da atividade de lobby denotam compreensão a respeito das dinâmicas que ocorrem nos setores da sociedade civil a fim de intervir nos processos decisórios estatais. Portanto é necessário enfrentar a temática através de normativos norteadores de limites sobre as temáticas. 
Apesar do retrocesso em relação ao financiamento privado de campanha, atividade que resvala na concepção errônea da atividade de defesa de interesses e relações governamentais, nota-se ambiente legislativo favorável à legalização da atuação do profissional representante dos grupos de pressão, bem como à estipulação de boas práticas dentre as relações governamentais.
Nesta seara a regulamentação da atividade é essencial para determinar marcos de transparência na atuação de grupos de pressão representativos de diversos setores junto ao Poder Público. Argumentar com algum ator político sobre determinada medida de política pública, dispositivo de projeto de lei, bem como apresentar plano de atuação alternativo, são atividades de defesa de interesses que fazem parte do contexto político democrático. A situação-problema surge pela ausência de marcos institucionais. Posto isso, a atividade de defesa de interesses acaba por ser confundida como algo vil, criminoso, indigno. Erronêamente associada ao suborno de autoridades.


segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Acordo de Leniência na Lei 12.846/2013. Breve comentário econômico e jurídico.

      Recentemente colocou-se em trâmite projeto de lei que visa alterar as regras para celebração do acordo de leniência previsto  na Lei 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção. O novo dispositivo pretende ampliar isenções às pessoas jurídicas e atores privados, impedindo a responsabilização penal e administrativa de pessoas físicas, retirando a impossibilidade de participação em licitações e contratações dentre empresas signatárias e prevê aplicação após publicação.
  Em virtude das recentes operações deflagradas, como a Lavajato e Zelotes, onde se investigam ilícitos contra a administração pública, o problema da ética corporativa mostra-se relevante na atualidade. Pode-se analisar os atos ímprobos cometidos pelos atores privados através do contexto socioeconômico, no qual tais práticas se inserem. Neste quadro, o acordo de leniência se mostra como importante instrumento de apoio à apuração e punição de delitos que violam o interesse público, ao passo em que viabiliza a continuação da atividade empresarial. 
  Surgido primeiramente no ordenamento jurídico pátrio como programa de leniência proposto pelo Conselho Administrativo de Defesa da Ordem Econômica – CADE, o acordo de leniência antitruste, em defesa da livre concorrência, está previsto nos arts. 86 e 87 da Lei 12.529/2011 que dispõe sobre a repressão à infrações contra a ordem econômica. O bom resultado do procedimento aplicado pelo CADE subsidiou o acordo exposto na Lei 12.846/2013.
  Deste modo, e nos moldes do programa de leniência citado acima, no artigo 16 §1º, a Lei 12.846/2013 estipula que a pessoa jurídica pode acordar leniência desde que três requisitos sejam respeitados a) a empresa ou associação deve ser a primeira a manifestar interesse em colaborar para investigar o ilícito, b) a pessoa jurídica deve encerrar imediatamente sua atuação na infração cometida assim que propor o acordo e admitir o ilícito e c) deve colaborar irrestritamente com toda instrução processual, comparecendo aos atos processuais até o encerramento. 
  Nota-se ai o interesse da administração pública em celebrar acordo de leniência a fim de recuperar rapidamente os danos ao erário, assegurar a disponibilização de documentos necessários para apuração do ilícito, bem como recolher informações sobre eventuais atos cometidos por outras empresas relacionadas. 
  Com a proposta de Projeto de Lei alterando o acordo, têm-se a possibilidade de ampliação das benesses oferecidas. Ressalvadas às críticas em relação aos conflitos de competência ocasionados na aplicação do instrumento pela Controladoria Geral da União – CGU e Ministério Público, o novo dispositivo deve expandir isenções às pessoas jurídicas e civis responsabilizadas por infrações administrativas e penais, dirimindo estes últimos de qualquer responsabilidade penal não pecuniária com a anistia à pessoa física. 
  Oportunamente a mudança surge na agenda governamental com aplicabilidade imediata caso seja sancionada e repercute na Operação Lavajato, em andamento. Antes de criticar o lobby que viabiliza a discussão acerca da alteração no acordo de leniência estipulado pela lei anticorrupção, deve-se ponderar sobre relevantes aspectos envolvidos. 
  Sabe-se que o crony capitalism, onde empresas se beneficiam de contratos chave com a administração pública, bem como aportes de investimento de fundos ligados ao Estado, é prejudical à economia. Neste modelo, existe uma distorção no mercado, onde projetos e decisões de investimento são influenciados por critérios políticos e contatos sociais, em vez de análises isentas sobre o mérito econômico da proposta. 
  Empresas que praticam corrupção através do suborno de funcionários públicos e representantes políticos, via financiamento de campanha, cobram a contrapartida ao serem favorecidas em contratos licitatórios de grande porte, como os relacionados à infraestrutura. Tais recursos são mal alocados na sociedade, pois favorecem apenas às partes envolvidas, em detrimento do interesse público e da economia.   
  Entretanto, apesar da leniência a tais infrações supor-se  absurda a priori, resguarda-se sua necessidade. Neste caso concreto, o acordo atua como contenção de danos à economia ao promover a manutenção da atividade produtiva dessas empresas. A continuidade da prestação de serviço por sua vez, evita pedidos de falência e recuperação judicial, mantém empregos, a confiança de investidores no fortalecimento de uma postura “de mercado” destas e por fim, cultiva o desenvolvimento de cultura com maior probidade e transparência no trato aos shareholders e stakeholders




domingo, 20 de novembro de 2016

Análise da crise dos refugiados sob a ótica do direito internacional humanitário

Em toda a história, a condição de estrangeiro sempre foi alvo de complicações e formação de conflitos entre os Estados. A maneira como este é tratado em um país que não o seu de origem não implica somente na preocupação se seus filhos terão onde estudar, se haverá oportunidade de emprego ou residência para morar. Mais do que isso, implica a questão da cidadania, especial pressuposto para o reconhecimento de sua existência em um Estado, estando intimamente ligada à observância de Direitos Humanos, particularmente o direito à vida e à dignidade, que se pressupõem serem plenos em qualquer parte do mundo.
Com a sucessão de guerras cada vez mais devastadoras e o advento da Primeira Guerra e, posteriormente, da Segunda Guerra Mundial, com consequências irrecuperáveis, houve uma evolução da consolidação dos Direitos Humanos aplicáveis ao Direito Internacional, o que fez com que o desenvolvimento do Direito Humanitário fosse cada vez mais se atrelando à evolução do próprio Direito Internacional Público.
Após a fundação da ONU e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, as conquistas de olhares mais solidários e de reconhecimento de direitos aos refugiados passaram a crescer e a se tornarem uma constante. Em 14 de dezembro de 1950, a Assembleia Geral da ONU criou o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) com o objetivo de fornecer proteção e assistência às vítimas de perseguição, da violência e da intolerância. Desde então, o instituto já foi responsável por mudar a vida de mais de 50 milhões de pessoas em todo o mundo.
Em Genebra, no ano de 1951, foi convocada uma Conferência de Plenipotenciários das Nações Unidas para redigir uma Convenção cujo objetivo era atender às necessidades de regulamentação da situação legal dos refugiados. Assim, em 28 de julho do mesmo ano, foi adotada a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados, que consolidou o dever dos Estados de cumprir com o que foi acordado e, principalmente, de respeitar esses direitos abordados, através de prévios instrumentos legais internacionais relativos aos refugiados, entrando em vigor em 22 de abril de 1954.
Assim, a Convenção, através do Estatuto dos Refugiados, estabeleceu diretrizes básicas sobre como deveria ser o tratamento dos refugiados em cada condição específica. No entanto, para preservar a autonomia e Soberania dos Estados acordantes, não impôs limites ao desenvolvimento desse tratamento.
Não se deve confundir imigração com refúgio, vez que este último é o acolhimento de pessoas perseguidas em razão de sua raça, religião, opiniões políticas, nacionalidade ou de seu grupo social. Assim, faz-se necessária uma regulamentação de quais pessoas especificamente nessas condições seriam consideradas refugiadas.
Os refugiados são pessoas que escaparam de conflitos armados ou perseguições. Com frequência, sua situação é tão perigosa e intolerável que devem cruzar fronteiras internacionais para buscar segurança nos países mais próximos, e então se tornarem um ‘refugiado’ reconhecido internacionalmente, com o acesso à assistência dos Estados, do ACNUR e de outras organizações.
O artigo 14 da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 estabelece o direito de toda pessoa, vítima de perseguição, procurar e gozar asilo em outros países. Nesse sentido, o ato de prestar abrigo e fornecer condições dignas de cidadania ou, ao menos, de condição humana para esse público é uma prática de Direitos Humanos.
Fundamentando-se nos princípios de proteção e respeito aos direitos do homem, a Declaração apresenta o direito de asilo e refúgio como forma de garantir as liberdades fundamentais, sem distinção de qualquer natureza. Assim, no instituto do refúgio pode-se destacar dois momentos.
Primeiramente, o momento no qual ocorrem os motivos causadores da coação que estimula o indivíduo a abandonar o país de origem, ou seja, o momento anterior ao reconhecimento da condição de refugiado. Depois, ocorre o momento posterior ao deslocamento para uma nova vida no país que deve acolhê-lo e protegê-lo. No entanto, a ameaça aos Direitos Humanos dessas pessoas, que estão em condições de vulnerabilidade, relaciona-se com as perseguições que costumam sofrer no país de destino. Tal violação tem sido fortemente sustentada pela ACNUR, principalmente no que diz respeito a uma ameaça à vida ou à liberdade por motivos de raça, religião, nacionalidade, opinião política ou pertencimento a grupo social, que segundo o Comissariado, deve ser sempre considerado perseguição.
Atualmente, com as guerras civis e ataques que ameaçam constantemente os países atingidos, acontece a maior crise de deslocamento forçado desde a Segunda Guerra Mundial, fazendo com que os imigrantes tenham que se refugiar em outro país, que nem sempre os vê com bons olhos ou lhes oferece condições dignas de subsistência.
Os governos dos países desenvolvidos tendem a ver as pessoas que chegam ilegalmente às suas portas como uma ameaça. A Austrália, por exemplo, tem um programa para receber um número limitado de imigrantes legais. Os ilegais são recolhidos em centros de detenção como o de Woomera, que fica isolado no meio de um deserto.
Embora a impressão divulgada seja de que os refugiados costumam procurar os países mais ricos, os novos índices têm indicado que são os países em desenvolvimento os mais procurados pelo fato de aceitarem a maioria dos imigrantes em situação de refúgio. No entanto, ainda é grande a procura pelos países Europeus, pelo fato da boa qualidade de vida, economia estável, educação, saúde e possibilidade de novas oportunidades.
Somente no primeiro semestre de 2015, mais de 350.000 pessoas deslocaram-se de países islâmicos, sobretudo da Síria e da Líbia, em direção à Europa, com destaques de maior índice imigratório para a Itália e a Grécia. A Primavera Árabe, ocorrida em 2011, foi palco para o desenvolvimento da guerra civil na Síria, que se estende até hoje. Desde então, os países muçulmanos vizinhos, como a Turquia, passaram a receber um enorme contingente de refugiados, que fugiam das condições catastróficas a que seu país estava submetido. No entanto, de um certo ponto em diante, quando esses países perceberam que a situação estava fora de controle, passaram a restringir a entrada desses refugiados.
As razões para esse fenômeno de migração forçada é, principalmente, a instabilidade política que as guerras civis recorrentes nos países de origem provocam, em especial a guerra na Síria, marcada pela atuação terrorista da facção Estado Islâmico, que está disseminando sua população e realizando atrocidades que o ao mundo inteiro surpreendem.
Outro fator desencadeante dessa situação é que os demais países muçulmanos, particular e principalmente os vizinhos à Síria e os países localizados na região do Golfo Pérsico, se recusam e apresentam resistência em acolher os refugiados, famílias inteiras que agora partem em direção ao leste e ao sul da Europa em busca de abrigo.
Os imigrantes sírios, por exemplo, entraram de forma massiva em países da Europa, tendo como principal portão de acesso os litorais da Grécia e da Turquia. Para chegar ao destino, a maioria arrisca a vida em travessias perigosas pelo Mar Mediterrâneo, a bordo de botes infláveis e barcos clandestinos.
Nesse contexto, o posicionamento dos países europeus sobre a aceitação ou não dos refugiados é um fato que tem gerado uma crise de essência simultaneamente ética e política, com reflexos em diversos campos da sociedade. Os especialistas que estudam as condições as quais esses refugiados estão submetidos têm levantado questões a respeito da trajetória percorrida por eles até o novo local de abrigo, das quais muitos não sobrevivem, chegando a ser um método cruel de extermínio.
Outro ponto importante é a questão relacionada à capacidade de países em plena crise econômica, como a Grécia, acomodarem, fornecerem emprego, educação e assistência social a milhares de refugiados, muitos deles que não possuem ao menos identificação e que já perderam a sua cidadania. Além disso, a diversidade cultural existente entre muçulmanos e europeus representa uma ameaça à vida pacífica nesses locais, principalmente quando atuam no âmbito moral, religioso e de condutas que devem ser seguidas de acordo com a sua fé.
É nesse ponto que surgem as controvérsias e discussões que estão transformando a situação em um caos, totalmente fora de controle, e que, de certa forma, representa também uma ameaça à estabilidade do país de abrigo. Vale destacar também que nos países europeus acolhedores existe uma constante preocupação com as possíveis ligações que essas pessoas, muitas delas indeterminadas, possam manter com os grupos terroristas, tais como a Al-Qaeda e o Estado Islâmico, o que é absolutamente facilitado nas presentes circunstâncias.
Recentemente, os noticiários estamparam o novo discurso do secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, que, tendo em vista os acontecimentos atuais, passou a pregar a necessidade de que os países acolhedores proporcionem respeito e dignidade aos indivíduos refugiados da África, Síria, Afeganistão e Iraque, que vivenciaram um terrorismo constante em seus países de origem a ponto de não encontrarem outra alternativa a não ser se refugiar, pois não havia mais esperança de vida ou dignidade para eles próprios e suas famílias.
Com isso, a ONU tem trabalhado a questão de despertar nos países que abrigam esses refugiados o interesse por melhor acolhê-los e protegê-los, dada a sua situação de vulnerabilidade em Direitos Humanos. Assim, a Organização visa estimular a comunidade internacional a desenvolver uma resposta global para o fluxo de população em massa. Nesse sentido, a visão que os países têm dos imigrantes como criminosos, buscando detê-los, impede a integração dos mesmos com a população local, sendo um obstáculo ao desenvolvimento de uma vida normal no novo local de residência. É preciso oferecer mais oportunidades para essas pessoas, mais condições dignas, com legalização e segurança, bem como ações de assistência social frente a tal carência de recursos de uma situação que acaba por financiar o contrabando e o tráfico de pessoas.
Por fim, destaca-se a importância do Direito Internacional Humanitário no tratamento aos refugiados, principalmente em um momento em que a sua vida e dignidade se encontram tão ameaçadas. Nesse ponto, é também papel da ONU e da ACNUR, como referência em Direitos Humanos voltados para as pessoas em situação de refúgio, estabelecer políticas que devam ser seguidas por todos os Estados, a fim de controlar a situação para preservar os direitos desses indivíduos, de modo a evitar que se torne um cenário natural assistir o drama dos refugiados e se acomodar com essa situação, que é absolutamente desumana e inaceitável.


      

terça-feira, 15 de novembro de 2016

Recuperação judicial: uma alternativa em meio à crise?

Não é incomum abrirmos os jornais e verificarmos uma série de notícias dando conta da crise financeira vivenciada de modo geral no país. E, nessa crise, vários são os envolvidos: pessoas físicas que estão com elevado comprometimento de renda, o que força a inadimplência para cima, ou mesmo, àqueles mais cautelosos que devido ao momento mais delicado na economia tratam de poupar seus recursos, evitando novos gastos.

E, em linhas gerais, assim caminham os rumos da economia, menos dinheiro no mercado, menos compras, menos vendas, menos giro no capital e, com o mercado desaquecido, várias empresas, até aquelas mais preparadas, acabam vivenciando com intensidade os efeitos da crise econômica.

Assim, pretende o instituto da Recuperação Judicial oferecer uma última alternativa àquela sociedade empresária que precisa se soerguer para evitar um trágico processo de falência. Ambos institutos, tanto a Recuperação Judicial quanto a Falência, estão previstos na Lei 11.101 de 2005, sendo recuperação uma espécie de última instância antes da fatídica sentença de morte, que é a falência.

A Lei 11.101/05, como avalia o próprio Senado Federal, na audiência pública para debater a eficácia dessa Lei em seus 5 anos de vigência, documento de lavra do então Senador Eduardo Suplicy, privilegia a preservação da empresa, sem deixar de lado, é claro, aqueles que dela confiam seus negócios e até mesmo sua subsistência.

A decretação da falência não é um bom negócio para ninguém. Você terá funcionários desempregados que precisaram ser realocados no mercado de trabalho, você tem fornecedores e prestadores de serviço que terão seu mercado reduzido e por consequência podem acabar amargurando, também, os dissabores do mesmo processo de falência, e terá o Governo que deixa de arrecadar, a medida em que não há mais produção econômica por parte daquela empresa. Tudo isso, fora tantos outros efeitos que a quebra de uma sociedade empresária pode ocasionar.

Dessa forma, a Recuperação Judicial se presta a oferecer uma última alternativa à continuidade da atividade produtiva, que, como mencionado acima, é o mais interessante para todos os envolvidos.

QUEM PODE SOLICITAR A RECUPERAÇÃO JUDICIAL?

Como já tratado, a Recuperação Judicial encontra previsão na Lei 11.101/2005. E logo de início a referida Lei já menciona as empresas as quais a Lei não se aplica: empresas públicas e sociedades de economia mista, instituição financeira pública ou privada, cooperativa de crédito, consórcio, entidade de previdência complementar, sociedade operadora de plano de assistência à saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e outras entidades equiparadas legalmente às anteriores.

Não se enquadrando em nenhuma das situações acima descritas, para fins de concessão da recuperação judicial, deverá ser preenchido, em primeiro plano, os seguintes requisitos cumulativos:
· Exercício regular das atividades há mais de 2 (dois) anos;
· Não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;
· Não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei.

QUAIS SÃOS OS MECANISMOS UTILIZADOS PARA VIABILIZAR A RECUPERAÇÃO JUDICIAL?

· Concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas;
· Cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente;
· Alteração do controle societário;
· Substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação de seus órgãos administrativos;
· Concessão aos credores de direito de eleição em separado de administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar;
· Aumento de capital social;
· Trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados;
· Redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva;
· Dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro;
· Constituição de sociedade de credores;
· Venda parcial dos bens;
· Equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto em legislação específica;
· Usufruto da empresa;
· Administração compartilhada;
· Emissão de valores mobiliários;

· Constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor.

domingo, 13 de novembro de 2016

A homofobia realmente mata?

Atenção: este texto não contém mimimi

Nos últimos anos, ouvimos repetidas vezes o termo “homofobia” [atualizado para “homolesbotransfobia”],  que pode ser interpretado como a repulsa, o preconceito e a violência contra a homossexualidade e/ou o homossexual, em razão de sua sexualidade, e é direcionado às pessoas homossexuais (gays, lésbicas, bissexuais, trans) ou heterossexuais confundidos como tal.

Mas afinal, a homofobia realmente mata?
Infelizmente, tal afirmativa é verídica e os índices (abaixo) mostram que tal fatalidade é muito maior que imaginamos. No Brasil, dado a vários fatores, questões relativas a atitudes preconceituosas, em qualquer que seja o assunto, vêm tomando grandes proporções, daí tais assuntos que por muito tempo eram considerados tabus, têm vindo à tona, ocorrendo, por sua vez, vários debates e proposições de atitudes que o quanto antes devem ser tomadas.

Quase diariamente algum tipo de crime homofóbico é noticiado, seria exagero ou realidade? As apurações policiais no Brasil, em sua maioria, concluem que se tratam de crime por motivo fútil, discriminação ou até racismo, em razão de que ainda não há, expressamente, leis que punam tal crime. Mas, tratar tal violação apenas como motivo fútil é suficiente? Provavelmente não, visto que, em nossa sociedade, é inaceitável a violação à pessoa, por vezes acarretando em homicídios, apenas pelo fato de sua condição, seja biológica, racial, financeira etc, logo, punir apenas com as atuais leis existentes, pode-se, em tese, deixar nossa sociedade sem uma resposta condizente com tal fatalidade.

E agravar a pena de delitos praticados a determinado grupo, não seria "privilegiá-los"? Tendo em vista que as políticas educativas são mínimas e a questão cultural é de difícil mutação, é justificável que o Estado tenha de punir com mais severidade e rigidez os crimes praticados por motivos que ultrapassam a agravante de futilidade, os que são praticados pelo simples fato do "não gosto", mas, além disso, as medidas a serem tomadas não podem se restringir a agravar penas, os mais recentes estudos provam, principalmente no Brasil, que não são só as medidas restritivas de liberdade que endireitam alguém, portanto, a questão cultural e educacional têm, também, de ser aprimorada no sentido de remodelar como enxergamos os indivíduos que convivemos em nosso dia a dia.

“EM 2015, 318 PESSOAS HOMOSSEXUAIS FORAM MORTAS NO BRASIL” [1]
Dessas, 52% eram gays, 37% travestis, 5% lésbicas, 3% bissexuais, 2% heterossexuais confundidos como gays, 1% amantes de travestis. Proporcionalmente, o Mato Grosso do Sul é o estado mais homofóbico com 6,49 casos de assassinatos para cada 1 milhão de habitantes. O Nordeste é a região mais perigosa, com 106 óbitos, Sudeste 99, Norte 50, Centro-Oeste 40 e Sul 21.



“O BRASIL É O PAÍS QUE MAIS MATA TRANSGÊNEROS NO MUNDO” [2]
Esta citação não é apenas um chamativo jornalístico, os dados mais recentes informam que em nosso país, entre 2008 e 2015, cerca de 845 transgêneros (+123 até set/2016) foram mortos, enquanto no México, segundo colocado, foram cerca de 247 seguido pela Colômbia 108, Venezuela 104 e Honduras 80.

Posicionamentos
Em posicionando favorável à criminalização da homofobia, o ex-Ministro do STF, Carlos Ayres Britto, declarou que "o homofóbico exacerba tanto o seu preconceito que o faz chafurdar no lamaçal do ódio. E o fato é que os crimes de ódio estão a meio palmo dos crimes de sangue".

Já em posicionamento contrário, mas com ressalva, por avaliar que a criminalização não reduziria a violência, Walter Maierovitch, desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, ressaltou, "ainda que eu não acredite que criminalizando se vá reduzir o número de casos, estamos em um estágio perigoso que legitima, sim, a criminalização. É pela educação e por mudanças culturais que isso se resolve, mas esses bandos têm saído impunes e não dá para a sociedade ficar sem uma resposta".

Portanto, não só a urgência da criminalização à homofobia, mas, também, a educação, a comunicação e a cultura têm papel fundamental na formação da população brasileira. Além de promover uma educação de qualidade, o Poder Público deve se preocupar em fazer com que essas políticas tenham maior abrangência de assuntos tabus a serem abordados. “Para tanto, é preciso um conjunto de posturas, ações e políticas educacionais que garantam uma educação de boa qualidade. Desse modo, a educação é compreendida como um direito em si mesmo e um meio indispensável para o acesso a outros direitos”, afirma Symmy Larrat [3].

Outrossim, não se trata de “combate à homofobia”, mas sim de “reeducação à convivência social”, pois não deve ser encarado como um combate, mesmo sabendo que o contexto leva ao sentido da destituição de um conceito pré concebido, entretanto, determinados termos utilizados podem levar a outro sentido, fazendo que, ao invés do respeito, se consiga apenas um combate, porém, não é disso que nosso país precisa, mas sim, de educação e cultura, visando trazer respeito às diversidades, seja relacionada a sexualidade, a cor, a raça, a condição financeira etc.





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1. Dados alarmantes sobre a violência contra a população LGBTI, acesso em 11 nov 2016, disponível em: <http://www.otempo.com.br/polopoly_fs/1.1324969.1466204387!/index.html>
2. 17th International Trans Day of Remembrance (TDoR), Transgender Europe: http://tgeu.org/ e http://transrespect.org/en/trans-murder-monitoring/tmm-resources/
3. Symmy Larrat é coordenadora da Secretaria Especial dos Direitos Humanos do Governo Federal, no debate e votação de propostas na 3ª Conferência de Políticas Públicas de Direitos Humanos de LGBT, realizada no mês de abril de 2016, acessado em 12 nov 2016, disponível em: <http://www.sdh.gov.br/noticias/2016/maio/reforco-do-sistema-nacional-de-promocao-dos-direitos-lgbt-e-pauta-central-das-propostas-da-3a-conferencia-nacional-lgbt>

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REFERÊNCIA E LEITURA COMPLEMENTAR
> STF: Carlos Ayres Britto defende criminalização da homofobia <http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=157896&id_secao=1>
> Dados alarmantes sobre a violência contra a população LGBTI http://www.otempo.com.br/polopoly_fs/1.1324969.1466204387!/index.html
> Projeto de criminalização da homofobia é arquivado no Congresso http://www.ebc.com.br/cidadania/2015/01/projeto-de-lei-contra-a-homofobia-deve-ser-arquivado-no-congresso
> Agressões e mortes exigem criminalização "urgente" da homofobia, defendem especialistas
> Criminalização da homofobia: ausência de leis dificulta combate ao preconceito no Brasil

A violação dos Direitos dos Anistiados do Plano Collor

Já nos idos de sua campanha eleitoral, o então aspirante ao maior cargo público na hierarquia deste país, o de Presidente da República Federativa do Brasil, Fernando Collor de Melo já abusava da retórica e de seu caráter histriônico. Como estratégia de marketing em sua campanha abusou do mote “caça aos marajás”, alegando que os funcionários públicos que ganhavam altos salários eram diretamente vinculados à corrupção - o que por certo não era verdade, já que o marajá era o então aspirante.
Eleito e empossado, Fernando Collor de Melo inicia a sua “caçada” aos, que resultou em mais de 120 mil servidores públicos demitidos sumariamente, sem um motivo jurídico plausível e sem o devido processo legal (artigo 5º, LV, CF).
Essa injustiça perdurou até a promulgação da Lei nº 8.878, de 11 de maio de 1994 que concedeu anistia aos servidores públicos civis e empregados da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, bem como aos empregados das empresas públicas e sociedades de economia mista que, no período entre 16 de março de 1990 e 30 de setembro de 1992, foram exonerados ou demitidos com violação dos dispositivos constitucionais ou legais.
Ainda que tal lei tenha reconhecido a injustiça perpetrada para com aqueles funcionários, a Administração Pública, in totum, continuou a ser a algoz dos anistiados, pois apenas começou a readmiti-los após 10 anos da promulgação, ocorrendo, devido à mora, situações jurídicas que alteraram a natureza jurídica de várias das empresas públicas, autarquias etc, em que os então funcionários trabalhavam.
Não bastasse o impropério da delonga no tempo, o Estado Brasileiro, ao promulgar a lei 8.878/94 dispôs, em seu artigo 2º, que o retorno no serviço público dar-se-ia “exclusivamente, no cargo ou emprego anteriormente ocupado ou, quando for o caso, naquele resultante da respectiva transformação.” 
Ou seja, ainda que admita em seu corpo normativo que os anistiados teriam de ser readmitidos devido à incongruência na aplicação das normas, legais ou constitucionais, esta mesma norma cerceou os direitos decorrentes do lapso temporal entre o afastamento e o seu retorno - arbitrariamente. Assim, a progressão funcional, inerente a quem faz carreira pública foi interrompida e, quando de seu retorno, como se não houvesse lapso temporal, retornou ao status quo, sem considerar o tempo de seu afastamento ao seu retorno.
O lapso entre o afastamento e o retorno também teve conseqüências sobre o regime de trabalho que então vigia à época, pois que, quando afastados, vários dos anistiados eram regidos pela CLT (Decreto-Lei nº 5.452/43 – Consolidação das Leis Trabalhistas) ou regidos pela Lei nº 1.171/52 (Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União), e quando retornaram já vigia a Lei 8.112/90, que passou a reger tanto aqueles celetistas quanto aqueles funcionários públicos sob a égide da Lei 1.171/52.
Assim sendo, o Regime Jurídico Único instituído pela Constituição Federal em seu artigo 39, assim como o § 1º, do artigo 243, da lei 8.112/90, não está sendo respeitado, pois o retorno ao status quo não observara o novo Regime Jurídico Único.
Conclui-se, portanto, que o Estado Brasileiro, agindo de forma absolutamente arbitrária, dragou direitos de seus funcionários sob a égide do então presidente Fernando Collor de Melo - que demagogicamente “caçou marajás” - e quando da promulgação da Lei nº 8.878/90, para anistiar esses funcionários, novamente destoou dos princípios basilares inscritos na Constituição Federal, não observando a progressão funcional natural e não observando o Regime Jurídico Único que deveria ser adotado.

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Sistema Penitenciário, Falido!

          Em todos os tipos de sociedade existem regras de conduta que são necessárias para a convivência harmoniosa, sejam elas codificadas ou não.
Antigamente, na civilização de povos primitivos, as regras de convívio não eram codificadas e não existia um órgão estatal que garantisse o cumprimento do direito. Dessa forma, para a satisfação de sua pretensão, o indivíduo tinha que agir por si só, através de seus próprios meios. A repressão aos atos criminosos se dava por regime de vingança privada.
Nas sociedades pós-modernas, o Estado passou a exercer a função do famoso ius puniendi e jus punitions. Ou seja, o Estado chamou para si o poder de legislar e o poder de punir.
As normas penais são regras que proíbem ou impõem um determinado comportamento, prevendo também uma sanção em caso de descumprimento. No âmbito penal, o  Estado deve considerar o direito de liberdade como regra, pois intrínseco a todos os homens, e a pena, em especial a pena privativa de liberdade, como exceção ao direito de liberdade. Assim, o direito de liberdade é a regra, mas que deve ceder em caso de prática de infração penal.
Perceba que os direitos inerentes à pessoa não cedem em virtude da prática de crime. A privação à liberdade não permite a inobservância aos direitos fundamentais e demais normas que proíbem tratamentos desumanos. Assim, os direitos de intimidade, honra, dignidade, integridade moral e física devem ser preservados, inclusive quando se tratar de condenado à pena privativa de liberdade.
Mesmo com tantas normas prevendo direitos humanos fundamentais, muitos deles são desrespeitados na prática. A atual preocupação não é adquirir novos direitos, mas impedir que os direitos já positivados sejam violados.
O preso, embora tenha seu direito de liberdade cerceado, continua sendo sujeito de direitos e deve ser tratado de forma digna, sendo observados todos os direitos fundamentais.

Não é isso o que ocorre na prática!

Os presídios são verdadeiros depósitos humanos, onde homens são jogados pelo Estado, que não oferece condições adequadas para o cumprimento de pena. As celas são fedorentas, úmidas, frias ou quentes demais e não possuem ventilação apropriada. A comida, a famosa “xepa”, é de péssima qualidade e muitas vezes fornecida estragada.

       Grande parte dos presídios brasileiros lida com superlotação, talvez o mais grave problema enfrentado pelo sistema. De acordo com os últimos dados coletados pelo DepartamentoPenitenciário Nacional, referentes a Dezembro de 2014, o número de presos era de 622.202, enquanto o nº de vagas no sistema prisional era de 371.884, significando que a taxa de ocupação é de 167% da capacidade.
Não foram divulgados dados recentes relativos à população carcerária, mas sabe-se que, ainda que haja um crescimento contínuo de número de vagas em presídios, este não acompanha o acentuado crescimento da população carcerária.
Devido à superlotação, muitos presos dormem no chão, pendurados em redes ou até mesmo amarrados às grades das celas.

Com a superlotação, os crimes dentro dos presídios aumentaram, rebeliões se tornaram mais comuns e a promiscuidade se estendeu.

Outros problemas corriqueiros são as condições precárias de higiene e a ausência de acompanhamentos médico e psicossocial. Condições adequadas de higiene evitam doenças. Acompanhamentos médico e psicossocial evitam o alastramento de doenças, assim como evitam situações de maus tratos, espancamentos e outras violências muitas vezes sofridas pelos encarcerados.
Muitos são os encarcerados contaminados por doenças dentro dos presídios que, ao terem relações com suas esposas em visitas íntimas, disseminam as doenças para o restante da sociedade.
Não podemos esquecer da corrupção por parte de agentes penitenciários. Os presos são extorquidos para obterem direitos que lhes deveriam ser fornecidos pelo Estado, como local para dormir, comida e produtos de higiene pessoal (escova de dente, sabonete, papel higiênico).
Se você pensa que é assim que deve ser, observe que a corrupção não se restringe à extorsão dos presos. Muitos servidores facilitam o crime organizado. Alguns exemplos são o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho, que são facções criminosas comandadas por detentos que atuam ativamente de dentro dos presídios. Os agentes facilitam também o ingresso de drogas, bebidas alcoólicas e armas.


O recebimento de visitas de familiares e amigos são fundamentais no processo de ressocialização do preso. No entanto, o sistema, quando não impede, dificulta as visitas e muitas vezes coloca os visitantes em situações vexatórias.





São diversas as violações aos direitos fundamentais e às legislações. O ponto em que pretendo chegar é a falência do sistema penitenciário!


Qual o objetivo da pena?
Mais que reprovar o agente pelo ato ilícito praticado, a pena tem a função de prevenir que futuros delitos ocorram, tem como finalidade a ressocialização do preso.
Em geral, a sociedade busca a execução da pena privativa como vingança. Consideram como regalia tudo o que deveria ser visto com normalidade: como alimentação, recebimento de visitas, banho e celas apropriadas. Comuns são os comentários: “tem que matar todo mundo!”, “Que direitos humanos o quê, tem é que sofrer!”. No entanto, como pronuncia Oscar Emilio Sarrule, “a vingança implica uma paixão, e as leis, para salvar a racionalidade do direito, devem ser isentas de paixões”[1].
Quando se fala em pena por vingança, temos os olhares voltados ao passado, “olho por olho, dente por dente”. Enquanto que, ao  tratar a pena como meio de ressocialização do indivíduo, o foco está voltado para o futuro, objetivando evitar novos delitos.
O Código Penal brasileiro adotou a pena como meio de reprovação e prevenção do crime. É necessário punir o sujeito autor de crime, mas de forma a prevenir a reincidência.
Para prevenir a reincidência, é necessário investir na reeducação e reinserção dos presidiários na sociedade. O sistema penitenciário deve ser reformado na prática, através do preparo adequado dos agentes penitenciários, para evitar prática de crimes dentro dos próprios presídios; do oferecimento de celas e ambientes adequados para o cumprimento da pena; do oferecimento de trabalho e estudo durante o cumprimento de pena, bem como atividades físicas;  do oferecimento de assistências médica e psicossocial adequadas e tudo o que for necessário para a garantia dos direitos fundamentais.
O objetivo do presente texto é induzir o leitor a refletir sobre a situação carcerária brasileira e a necessidade e importância de sua reforma.
Devemos lembrar que as pessoas que estão sendo tratadas de forma desumana retornarão ao convívio social.

Cabe a nós decidir se retornarão melhores ou piores!



Portanto, se você não reconhece os presos como sujeitos de direitos e não os vê como seres que precisam de assistência e cuidados, tudo bem! Mas lembre que esse seres um dia retornarão às ruas e é de extrema importância, inclusive para sua segurança e de seus familiares, que voltem reeducados, acreditando na possibilidade de uma vida digna, alcançada através do trabalho lícito.




Referências:
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 13ª edição – Niterói, RJ: Impetus, 2011.
GRECO, Rogério. Sistema Prisional: colapso atual e soluções alternativas. 3ª edição – Niterói, RJ: Impetus, 2016.
http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.phpn_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=129





[1] SARRUELE, Oscar Emílio. Las crisis de legitimidad del sistema jurídico penal. In: GRECO, Rogério. Sistema Prisional: colapso atual e soluções alternativas. 3ª edição – Niterói, RJ: Impetus, 2016. p.218